segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Crítica(s)?


Afirmava Theodor Adorno que, na investigação em ciências sociais, é necessário adequar a coisa ao conceito e não o conceito à coisa. Rejeição do empirismo, portanto. Empirismo que é acusado - na sua versão sociológica, o positivismo - de, por ser mera adequação à realidade existente, encerrar o pensamento sobre o social no quadro das estruturas de dominação próprias a uma determinada formação social e, no limite, tornar-se mero conhecimento de tipo tecnocrático, ao serviço dos poderes existentes.


A questão que este tipo de posicionamento me suscita é a de saber se o distanciamento crítico inscrito na organização conceptual não empirista do trabalho sociológico pode apenas redundar numa crítica à dominação. Diria que não. Diria mesmo que a questão me parece quase retórica, se pensarmos no conceito de «tipo ideal» de Weber. Um tipo, para Weber, representa uma abstracção, de tal modo que não encontraremos nunca uma realidade empírica que se conforme completamente à sua descrição. Não obstante, possui forte fecundidade heurística, como sabem os sociólogos, quando comparado com as realidades empiricamente observáveis no sentido de se perceber em que medida as mesmas dele se desviam.


O vasto património científico da sociologia tem assim, pelo menos desde Weber, um exemplo claro da possibilidade de distanciamento crítico que não seja uma crítica social da dominação. Por outro lado, o mesmo exemplo afasta com clareza o fantasma tecnocrático, espécie de distopia sociológica brandida amiúde e com afinco pelos mais ínclitos representantes da Teoria Crítica. Assim, empirismo e crítica da dominação não são as únicas opções teórico-epistemológicas deixadas ao sociólogo.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Crítica Habermasiana

Imagem obtida em:http://endireitandoeendireitando.blogspot.com/2010/06/jurgen-habermas-pensamento.html

«A consciência tecnocrática é, por um lado, "menos ideológica" do que todas as ideologias precedentes; pois, não tem o poder opaco de uma ofuscação que apenas sugere falsamente a realização dos interesses. Por outro lado, a ideologia de fundo, um tanto vítrea, hoje dominante, que faz da ciência um feitiço, é mais irresistível e de maior alcance do que as ideologias de tipo antigo, já que com a dissimulação das questões não só justifica o interesse parcial de dominação de uma determinada classe e reprime a necessidade parcial de emancipação por parte de outra classe, mas também afecta o interesse emancipador como tal do género humano».

Jürgen HABERMAS, Técnica e Ciência como «Ideologia»

terça-feira, 14 de setembro de 2010

II Colóquio Luso-Brasileiro de Sociologia da Educação


Nos passados dias 8, 9 e 10 de Setembro, decorreu na Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Portalegre o II Colóquio Luso-Brasileiro de Sociologia da Educação, evento em cuja Comissão Organizadora tive a honra de participar.
A meu ver, foi um Colóquio com um nível elevado de discussão científica, associado a um ambiente cordial, amistoso e próximo. Não quis deixar de o assinalar.

Mais informações em:
http://www.esep.pt/documentos/II%20COLÓQUIO%20LUSO-BRASILEIRO%20DE%20SOCIOLOGIA%20DA%20EDUCAÇÃO/12072010flyer-coloquio.pdf

domingo, 5 de setembro de 2010

Reconhecimento II

Axel Honneth
Retirado de: http://www.information.dk/191944

Nos termos de Axel Honneth, a reificação não resulta de um processo no qual se oponham o reconhecimento e a objectivação. Para o sociólogo alemão, ela acontece quando a objectivação envolve um esquecimento da relação primária (genética e categorialmente primária) que mantém com o reconhecimento.


As teses que Honneth sustenta, a este respeito, indicam, parece-me, uma espessura antropológica entendida pelo autor como irredutível (e, designadamente, irredutível às teses utilitaristas). É esta irredutibilidade, penso, que sustenta toda a possibilidade de uma crítica às formas de reificação. O autor, por outro lado, tem o particular discernimento de não reduzir a objectivação à reificação, procedimento que anularia eventualmente a possibilidade de qualquer discurso crítico ou científico sobre as sociedades humanas.

Reconhecimento I

Axel Honneth
Imagem retirada de: http://gramscimania.blogspot.com/2010/06/entrevista-con-axel-honneth-nunca-ha.html

Preocupação, participação ou envolvimento, de acordo, respectivamente, com as terminologias de Heiddeger, Lukács e Dewey: expressões diferenciadas que designam algo de assaz próximo daquilo que Axel Honneth nomeia como reconhecimento. O reconhecimento, para Honneth, precede, no duplo sentido genético e conceptual, o conhecimento. É na relação prática com o mundo, espécie de simpatia existencial, que se funda o acto cognitivo, ao contrário do que pretende a atitude «tradicional» que julga ver na pura relação cognitiva entre um sujeito e um objecto o fundamento da relação humana com o mundo. Noutra linguagem, Deweyana, o envolvimento na situação precede o processo de abstracção - cognitiva, linguística - de um aspecto particular da mesma, ele mesmo enraizado e retirando parte do seu sentido desse envolvimento.

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Memória II

«A teoria da consciência colectiva constitui a trave mestra da sociologia de Durkheim. É a sua ogiva; é sobre ela que se apoia toda a sua concepção da especificidade do social e da sua irredutibilidade a outros sectores do real. Ela está na origem do seu método sociológico, da oposição que estabelece entre a solidariedade mecânica e a solidariedade orgânica, da sua sociologia jurídica e da sua sociologia religiosa, da sua teoria do suicídio e da sua interpretação do Totem e do Maná, na origem enfim da sua ciência dos factos morais e da sua teoria dos valores».
Georges Gurvitch, A vocação actual da sociologia (Ed. Or. de 1968, póstuma).

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Metodologia de investigação I

Numa proposta já com alguns anos, Michelle Lessard-Hébert, Gabriel Goyette e Gérald Boutin propõem que se conceba o processo de investigação apoiado numa estratégia de investigação qualitativa como um espaço quadripolar, organizado portanto em torno de quatro pólos que se implicam mutuamente: o pólo epistemológico, o pólo teórico, o pólo morfológico e o pólo técnico.
Não irei aqui tratar, com a detenção merecida, o pólo morfológico, mas pretendo deixar exposta uma citação que nos remete para um domínio de trabalho e reflexão do investigador, por exemplo o sociólogo, que nem sempre é recordado como devia ser:
«O pólo morfológico relaciona-se com a estruturação do objecto científico; estruturação essa que se exprime através de três características fundamentais.
Este pólo opera, em primeiro lugar, ao nível da exposição do objecto de conhecimento, de uma forma superficial pelo estilo através do qual o investigador exprime os seus resultados mas, fundamentalmente, pela construção de modelos, que podem ser lineares ou "tabulares", de tipo simbólico ou icónico.
Em seguida, a função do pólo morfológico reporta-se a um espaço de causação. A causação é uma posição de coerência lógica e/ou significativa que articula os factos científicos numa configuração operativa. Ela suscita o problema do atomismo ou do holismo, da explicação ou da compreensão. A "explicação" remete para um tipo de causalidade "externa" e visa isolar invariantes ou leis. A "compreensão" origina um tipo de causalidade "interna", tipo expressivo que se refere ao significado dos fenómenos compreendidos como totalidades por um sujeito.
Por último, a função do pólo morfológico é a de permitir uma objectivação dos resultados da investigação, que se processa segundo vários modos.
No âmbito do nosso estudo das metodologias qualitativas, examinaremos, em primeiro lugar, a "estruturação" dos resultados da investigação, ou seja, aquilo que é normalmente apelidado de organização e apresentação dos resultados; trata-se de uma das etapas, ou componentes, da análise dos resultados. Seguidamente, debruçar-nos-emos sobre as modalidades de redacção de um relatório de investigação».
Autores citados, Investigação qualitativa - fundamentos e práticas. Lisboa: Piaget.